terça-feira, 29 de dezembro de 2015

HUIHAN LIU

HUIHAN LIU - Belezas tibetanas - Óleo sobre tela - 76,2 x 61

É emocionante ver a trajetória de vida de certos artistas e o grau de maturidade artística e respeito que conquistaram. A trajetória de Huihan Liu é de orgulhar qualquer carreira. Nascido em Guangzhou, na China, em 1952, é mais um dos bem-sucedidos artistas chineses que vieram complementar suas carreiras no oeste americano.

HUIHAN LIU - Primavera na Vila Miao
Óleo sobre tela - 76,2 x 101,6

HUIHAN LIU - Partida - Óleo sobre tela - 45,7 x 61

Huihan Liu cresceu ali mesmo, em Guangzhou, capital da província de Cantão, e teve a infelicidade de estar naquele lugar num de seus momentos mais difíceis, durante os primeiros anos da República Popular. A fome sempre foi um estado permanente naqueles tempos, afirmou o artista certa vez. Se para se manter vivo já era difícil, imagine para um artista que resolvera abraçar a profissão. Seus primeiros anos de aprendizagem se limitaram basicamente a exercícios com lápis e papel. Era apenas com esses materiais, os únicos que conseguia comprar, que ia a campo fazer esboços de árvores e casas. Quando possível, ia também ao zoológico local para exercitar desenhos de animais. Dedicado, tirou o melhor proveito possível do estilo realista, vindo da influência de escolas soviéticas. Praticou incansavelmente os exercícios de sua escola e isso fez com que assimilasse muito bem todos os princípios básicos de um bom artista.

HUIHAN LIU - Hora do chá - Óleo sobre tela - 50,8 x 40,6

As coisas pioraram ainda mais em 1966, quando o Presidente Mao Tse Tung lançou a Revolução Cultural. Aquela revolução tinha como principal objetivo erradicar qualquer vestígio de capitalismo que houvesse no país e consolidar, de vez, as propostas comunistas que foram criadas com o movimento. Mudanças drásticas ocorreram em todo o território chinês e pessoas de todas as idades e classes foram seriamente atingidas. O próprio pai de Huihan Liu, que era um professor de literatura chinesa antiga, foi deposto de seu cargo e obrigado a seguir com a família para o campo, onde faria reeducação socialista.

HUIHAN LIU - Conversas da manhã - Óleo sobre tela - 61 x 76,2

Como bom artista, Liu ainda foi mantido nos estudos da escola secundária, juntamente com outros estudantes que se destacaram. Eram obrigados, porém, a criar obras que glorificassem o partido e os seus líderes. Huihan Liu ainda se dizia de sorte, por estar fazendo aquilo que sempre quis, desenhar e pintar. Passava todo seu tempo pintando intermináveis propagandas do Presidente Mao e de seus exércitos. Nos raros momentos de folga, pintava algumas paisagens.

HUIHAN LIU - Brumas da manhã na vila - Óleo sobre tela

Seus horizontes se abriram, pela primeira vez, em 1967, em uma visita que fez ao extremo oeste da China. Lá, viu diferentes costumes e estilos da região que ele morava. Mas, novamente as coisas se dificultariam nos próximos anos. Após o término de seu ensino médio como artista, Liu foi designado a trabalhar numa fábrica. Incansável, conseguia economizar alguns recursos para comprar o mínimo de material artístico, e aderir a um grupo local de artistas que se reunia para pintar nos momentos de folga.

                                
Esquerda: HUIHAN LIU - Visitas do feriado - Óleo sobre tela - 61 x 45,7
Direita: HUIHAN LIU - Três gerações - Óleo sobre tela - 91 x 45,7

Somente em 1972, quando a forte opressão de mais de uma década começou a diminuir, Huihan Liu começou a ter boas notícias para sua carreira artística. A Academia de Belas Artes de Guangzhou estava aceitando candidaturas e foi, com o auxílio de um de seus antigos mestres, Zhang Ton, que ele conseguiu o consentimento para ser admitido nela. Segundo o próprio Liu, “foi uma experiência maravilhosa”. Após a formatura, em 1975, o Estado o colocou na organização de reuniões para sindicais e o designou para pintar retratos de Mao (que morreu em 1976). "E no meu tempo livre", acrescenta ele, "eu estava pintando para a minha família, amigos e vizinhos."

HUIHAN LIU - Dia de mercado - Óleo sobre tela - 40,6 x 50,8

A felicidade atingiria o grau máximo para o artista quando, em 1979, foi indicado para o cargo de professor na Academia Guangzhou. Além de ensinar, ele poderia ter tempo para pintar aquilo que quisesse. Não perdia tempo, produzia várias ilustrações para livros didáticos, como um trabalho freelance. E ainda não mediu esforços para se pós-graduar em Guangzhou, entre 1985 e 1987. Seu mundo já parecia pequeno e ele queria sempre mais. Com pouco mais de trinta anos de idade, ele agora fazia planos de conhecer museus ocidentais e visitar as pinturas originais que sempre pode admirar somente por livros e revistas. Veio a realizar esse seu sonho, quando foi aceito na Academy of Art University, em São Francisco, nos Estados Unidos. Com muito pesar, deixou esposa e filho para trás e partiu para lá. Eles se juntaram a ele somente um ano depois. Ele se graduou nessa faculdade em 1993. Diante de um mercado bem mais promissor que o chinês naquela época, Liu se naturalizou cidadão americano em 1999.

HUIHAN LIU - Voltando para casa - Óleo sobre tela - 61 x 45,7

O artista foi ganhando experiência com o novo mercado e se adaptando da melhor maneira que conseguia. Foi somente em 1995, que aconteceria uma grande virada na sua carreira artística. Liu viajou novamente para o Tibete, na mesma região que visitara oito anos atrás. Ele afirmou naquela época: “Essas pessoas se hospedaram em meu coração, e sinto que, se puder expressar a paixão que sinto por elas, os americanos possam se interessar pelo meu trabalho”. Munido de esboços e fotografias que colheu em sua estadia por lá, retornou para o estúdio de São Francisco e se pôs a produzir tudo aquilo que havia lhe emocionado bastante na viagem. Rapidamente, seu trabalho foi ganhando notoriedade e agradando crítica e público. Havia sinceridade em tudo que produzia e isso lhe bastava. Aos 44 anos de idade, ingressava de vez como um respeitado artista do mercado americano.

HUIHAN LIU - Antes da colheita - Óleo sobre tela - 76,2 x 101,4 - 2005

Sua carreira ainda continua fundamentada com a produção nas aldeias tibetanas, para onde viaja sempre que possível, mas, também expandiu sua produção com temáticas indígenas do oeste americano. Versatilidade não lhe falta. Continua desenvolvendo um realismo com forte influência impressionista, como ele mesmo gosta de classificar. Mais do que nunca, o artista procura penetrar no íntimo de cada pessoa e fazer da sua arte, uma ponte delas com o mundo. Seja na China, com os aldeões dos locais mais remotos, ou com descendentes indígenas do oeste americano, Liu se vê um artista das pessoas do mundo. Ele também adquiriu respeito e notoriedade no seu país de origem, tendo inclusive livros lançados por lá. Os anos difíceis do passado foram finalmente recompensados. Liu olha para trás e os vê como degraus necessários e valiosos para chegar onde chegou.


PARA SABER MAIS:



terça-feira, 22 de dezembro de 2015

A HUMANIDADE NUMA ENCRUZILHADA

ELON BRASIL - Maternidade Kamayurá - Mista sobre tela

Somos cerca de 7 bilhões de habitantes no planeta. E pasmem! Daqui no máximo 110 anos, todos nós já teremos sido substituídos. Eu, você, todos... A vida é assim: cíclica. Uns vem, outros vão... O certo é que ninguém fica. Essa transitoriedade de tudo que é vivo ao mesmo tempo nos fascina e ao mesmo nos incomoda. Queremos esticar ao máximo a nossa estadia por aqui, e isso tem exigido um preço alto demais desse planeta.

              
Esquerda: VASCO MACHADO - Moça de rosa - Óleo sobre tela - 60 x 50
Direita: TALLMAN SCOTT POWERS - O filósofo de Bayeux - Óleo sobre tela - 30,4 x 20,3

Uma das questões polêmicas atuais, que anda movimentando o meio científico, diz respeito à resistência das bactérias. Pelo uso indiscriminado e inconsequente dos antibióticos produzidos pelo homem, muitas bactérias comuns estão se transformando em superbactérias e, dentro de no máximo uma década, segundo os pesquisadores, muitas doenças que hoje são facilmente curadas, serão facilmente letais.
Há cerca de 100 anos, a média da vida humana no planeta era de 20 anos menor que a média de hoje. As condições de vida melhoraram em várias regiões do mundo e também se deve isso às novas classes de medicamentos, principalmente antibióticos, que foram sendo desenvolvidos e permitindo nossa maior longevidade. Uma maior média de vida parece uma conquista para a espécie humana, mas se transformou na desgraça do planeta Terra. Mais pessoas vivas, vivendo por mais tempo, exige uma produção incalculável de tudo que é produto, desde a maior produção de grãos, porque há mais bocas para serem saciadas, até a extração de mais minerais, pois há mais construções e equipamentos a serem oferecidos. O planeta já deu provas que não suporta mais isso e começa a dar suas respostas.

                
Esquerda: JEREMY LIPKING - Skylar em azul - Óleo sobre tela - 40,6 x 30,4
Direita: JOSÉ ROSÁRIO - Pequeno músico - Óleo sobre tela - 40 x 30 - 2014

Pensamos somente em sobreviver a nossa espécie, mas milhões de outros organismos desse planeta também lutam pela mesma estratégia. A Teoria da Evolução já nos ensinou isso: vencem os mais adaptados ao meio. Parece ilógico pensar, mas todas as conquistas médicas adquiridas até então, retornarão ao seu ponto de cerca de 100 anos, caso as coisas continuem nessa expectativa. E não só apenas os medicamentos para o uso humano tem colaborado com isso. Na ânsia de produzir mais alimentos, muitos antibióticos também foram criados para potencializar as espécies domésticas que abastecem o homem (boi, porco, galinha...). Isso realmente não poderia terminar bem! Os animais se fortalecem, mas as enfermidades que os assolavam também fazem o mesmo. Até bem pouco tempo atrás, para sacrificar uma galinha, eram necessários de 5 a 6 meses. Hoje, um frango é abatido com apenas 45 dias, graças ao uso indiscriminado de hormônios e antibióticos. Não se pode esquecer que esses produtos são repassados ao ser humano pela cadeia alimentar.

              
Esquerda: MORGILLI - Caipira picando fumo - Óleo sobre tela - 45 x 30
Direita: SCOTT BURDICK - O manto - Óleo sobre tela - 101,6 x 76,2

Não se diz respeito somente à saúde e à área biológica. Recentemente, a tragédia ecológica acontecida em Mariana, Minas Gerais, foi apenas uma pequena prova de como o “excesso” vem prejudicando a continuidade da espécie humana nesse planeta. Para produzir mais, empresas geram mais lixo e precisam estocar mais esse lixo. Quando os lucros diminuem, os cuidados necessários com os rejeitos vão sendo colocados de lado. Mas, a natureza sabe dar suas respostas. E cobra caro quando resolve fazer isso. Ainda nem sabemos as consequências de tudo que aconteceu por lá. E acredito que até mesmo os estudiosos alimentam as mesmas dúvidas.

              
Esquerda: LUIZ VILELA - Alex - Óleo sobre painel - 30,4 x 22,8
Direita: MIAN SITU - Anos de marcas - Óleo sobre tela - 40,6 x 30,4

O presente texto é apenas uma chamada de consciência. Fim de ano parece ser um momento especial para isso, apesar de que a seriedade desse assunto deveria estar em pauta durante todo o ano. Todos devemos buscar uma vida mais simples, aprender a viver com o suficiente e valorizar, acima de tudo, todas as relações pessoais. O planeta já acena com os seus limites e precisamos urgentemente entender suas mensagens.

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As ilustrações dessa matéria trazem imagens de diversas pessoas, pintadas por diversos artistas. A riqueza do que há de melhor em nossos povos, mostrará o caminho que precisamos para juntos encontrarmos a melhor saída.

domingo, 13 de dezembro de 2015

IVAN SHISHKIN

IVAN SHISHKIN - Floresta de pinheiros na Província Viatka - Óleo sobre tela - 78,7 x 107,3

IVAN SHISHKIN - Pinheiros - Óleo sobre tela - 91 x 70,5 - 1866

Poucos artistas dedicaram tanto a uma temática artística, como fez o russo Ivan Shishkin pela paisagem. Em cerca de 40 anos de trabalho, ele produziu centenas de grandes pinturas, milhares de estudos e desenhos e um número incalculável de gravuras. Ele fez isso com tanto envolvimento, que suas obras se tornaram rapidamente símbolos originais da Rússia e o tornaram um dos mais populares artistas daquele país.

IVAN SHISHKIN - Meio-dia, arredores de Moscou
Óleo sobre tela - 111,2 x 80 - 1869 - Galeria Tretyakov, Moscou

IVAN SHISHKIN - Manhã na floresta de pinhos
Óleo sobre tela - 139 x 213 - 1889 - Galeria Tretyakov, Moscou

Ivan Ivanovich Shishkin nasceu em Yelabuga, atual Tartaristão. Era filho de comerciantes locais prósperos, que sempre tiveram propostas artísticas para seus familiares. Tido como pessoas de mentes abertas para seu tempo, apoiaram sem hesitação a carreira de pintor para seu filho. Entre 1852 e 1856, ele estudou na Escola de Pintura e Escultura de Moscou e os 4 próximos anos continuaria seus estudos na Academia de Artes de São Petersburgo. Seu progresso foi rápido e num breve período, conquistou todos os prêmios oferecidos por aquela academia.

IVAN SHISHKIN - Rye - Óleo sobre tela - 107 x 187 - 1878 - Galeria Tretyakov, Moscou

Detalhe

Conquistando 3 anos de estudos em países europeus, com incentivos do governo, estudou com artistas diversos na Alemanha, Suíça, República Checa, França, Bélgica e Holanda. Já um pouco cansado da viagem e decepcionado com as propostas paisagísticas de seus mestres, decidiu retornar para Moscou. Ele tornou-se membro da Academia Imperial de São Petersburgo e viria a ser um professor naquela instituição entre os anos de 1873 e 1898. Foi nesse período, que desenvolveu o programa educacional de pintura paisagística. Amante dessa temática como ninguém, foi um dos precursores para que a paisagem não fosse apenas o pano de fundo para as composições históricas e alegóricas. Determinado, elevou a temática paisagística a um nível nunca antes alcançado.

IVAN SHISHKIN - Velhos carvalhos - Óleo sobre tela - 125 x 195 - 1887

IVAN SHISHKIN - Floresta - Óleo sobre tela - 100 x 74 - 1889

Pela determinação e luta solitária por uma proposta que ainda não havia conquistado inteiramente um grande público, Shishkin foi conhecido por seus contemporâneos como um “velho pinheiro” ou “carvalho solitário”, tamanha era sua resistência e obstinação. Mas, fez isso com tanto amor que os resultados logo vieram. E, ainda em vida, a sua popularidade com a temática paisagística era assustadora.

IVAN SHISHKIN - No parque - Óleo sobre tela - 82,5 x 111 - 1897

IVAN SHISHKIN - Floresta de pinheiros
Óleo sobre tela - 147 x 91 - 1897

Um fato curioso da carreira de Shishkin, é que sua vida conturbada e triste nunca transpareceu em sua obra. Ele casou duas vezes, ficou viúvo duas vezes e também perdeu os filhos desses dois casamentos. No entanto, quando pintava, queria as cenas alegres dos dias que caminhava pela floresta e campos, por isso tinha preferência pelas cenas diurnas, cheias de luz solar. Por uma abordagem primorosa aos detalhes, que muitos críticos contemporâneos consideravam excessiva, alguns de seus trabalhos recebiam duros comentários. Mas, ele não se abalava e mantinha sua proposta.

IVAN SHISHKIN - Rio na orla de uma floresta - Óleo sobre tela - 33,5 x 57,5 - 1882

IVAN SHISHKIN - Um canto de jardim - Óleo sobre tela - 1884


Entre os pintores de paisagens russas, Shishkin foi o expoente mais firme e mais consistente da estética materialista - para descrever a natureza em toda sua pureza, beleza e sem adornos. Seu papel na arte russa não perdeu sua importância, mesmo nos anos que viu a aparência de belas paisagens sendo desenvolvidas por novos nomes como Isaac Levitan, Valentin Serov e Constantin Korovin. Esses artistas, mesmos com propostas estilísticas bem mais arrojadas para seu tempo, flertando todos eles com a corrente impressionista que vinha da Europa, ainda reconheciam em Shishkin o grande alicerce e o maior batalhador para que a temática paisagística conquistasse respeito. A nova geração não deixou de reconhecê-lo como um retratista pensativo e magistral da natureza russa. Shishkin faleceu em seu estúdio, em São Pertersburgo, em 1898, diante de uma tela recém-espichada, prestes a desenvolver um novo trabalho. A pintura russa perdia um de seus mais dedicados artistas.

IVAN NIKOLAJEWITSCH KRAMSKOI
Ivan Shishkin - Óleo sobre tela

domingo, 6 de dezembro de 2015

FRAGMENTOS DE HISTÓRIAS: DIONÍSIO E SUA GENTE


Estamos vivendo um período de transição na história da humanidade. Da palavra escrita sendo substituída pela palavra digitalizada, do livro impresso dando lugar cada vez mais às publicações virtuais. Algo parecido ocorreu na Idade Média, quando a imprensa foi inventada por Gutemberg, e tudo que era publicado em rolos de pergaminho ou couro, foi sendo substituído por livros de papel, confeccionados com trapos de algodão e mais tarde em celulose.
As bibliotecas atuais estão cada vez mais vazias. Famosas e tradicionais livrarias fecham suas portas... Tudo pode ser conseguido com um simples tocar de teclas ou pela tela de um smartphone. Já existe até uma nova linguagem, resumida e criada exclusivamente para atender ao público cada vez mais apressado e com menos tempo para o passado. O futuro é algo urgente e todos estão cada vez mais escravizados a ele. Por isso, quando alguém toma a iniciativa de visitar o passado e faz isso com tanta dedicação e competência, é preciso reverenciar. A iniciativa de Fábio Americano, em resgatar a história da cidade de Dionísio, é duplamente louvável: primeiro, porque torna acessível a todos que viveram um pouco dessa história, um momento de nostalgia e recordações. Em segundo, porque dá oportunidade às novas gerações de conhecer uma parte significativa da origem da cidade. E, convenhamos, a sensação única de virar as páginas de um livro e viajar com ele, será muito dificilmente substituída. Há todo um ritual que antecede isso: a poltrona no canto da sala, a escolha do melhor ângulo de luz, o retiro necessário para entrar naquele livro...






Para o livro ficar completamente pronto; até o dia do lançamento; foi preciso uma longa jornada, que se iniciou lá pelos idos de 1998. Um grande número de fotografias antigas e vários documentos que chegavam a sua posse, fizeram com que o Fábio tomasse a iniciativa da difícil tarefa de transformar tudo aquilo em um único livro. Como uma colcha de retalhos, cujos pedaços foram sendo colhidos aqui e ai, pela solidariedade de muitos que cediam fotos e arquivos, Fábio foi alinhavando sua criação. Uma jornada nada fácil, mas imensamente prazerosa. Toda criação parece ser mesmo assim. O longo e cuidadoso período de gestação é imensamente proveitoso e válido, quando o parto acontece.




JOSÉ ROSÁRIO - Praça São Sebastião, Dionísio, década de 1950 - Óleo sobre tela
Obra executada à partir das referências acima

FRAGMENTOS DE HISTÓRIAS: DIONÍSO E SUA GENTE é um livro denso e cativante. São 474 páginas, mais de 1600 imagens e um sem números de arquivos e documentos anexados. É uma espécie de documento que todo cidadão dionisiano deveria guardar com o maior orgulho. Uma resumo de toda a história do município. Fala e mostra especialmente a história de sua gente, porque a história de uma cidade nada mais é do que a trajetória de seu povo. Para se adequar aos novos tempos, é propósito do autor que uma versão digitalizada será pensada logo em breve. Ele também realça que todos aqueles que possuem fotos e arquivos que não estiveram nessa edição, podem ser anexados em edições futuras, basta entrar em contato com ele.
Mesmo que os novos tempos exijam pressa e acenem inevitáveis mudanças, é necessário guardar estes registros e rever as trajetórias. Só quando se sabe de onde se vem, é possível escolher para onde ir.


Esquerda: JOSÉ ROSÁRIO - Fazenda em Dionísio, década de 70 - Óleo sobre tela - 54 x 65 - 1995
Direita: JOSÉ ROSÁRIO - Praça São Sebastião, década de 80 - Óleo sobre tela - 30 x 40 - 1996

JOSÉ ROSÁRIO - Praça em Baixa Verde - Óleo sobre tela - 40 x 100 - 1998

JOSÉ ROSÁRIO - Rua Dr José Mateus de Vasconcelos, década de 80 - Óleo sobre tela - 50 x 70 - 2012

Esquerda: JOSÉ ROSÁRIO - Pregando ferradura - Óleo sobre tela - 50 x 70 - 2008
Direita: JOSÉ ROSÁRIO - Vendedor de Mexerica - Óleo sobre tela - 30 x 40 - 2015


Fico orgulhoso por ter contribuído com algumas fotos que compõe o livro. Algumas, antigos artigos que colecionava e outras, com obras de minha autoria que ilustram algumas páginas. Muitas fotos contidas no livro já serviram também como fontes de referências para diversos trabalhos meus.
Ficamos todos gratos ao Fábio, por resgatar nossa história e ressuscitá-la para muitos. Dizem que o homem só é eterno quando o seu trabalho permanece.


Com Fábio Americano, no lançamento do livro
em Dionísio.
5 de dezembro de 2015

quinta-feira, 26 de novembro de 2015

MARIANA: QUE FUTURO NOS ESPERA?



Ainda é preciso falar sobre o crime ecológico de Mariana. Não esquecer o que fizeram à natureza e que ainda nos trará amargas consequências. Deixo abaixo, um texto redigido pelo Naelson Almeida. Traduz a insatisfação de alguém que, mesmo distante, também sofre os horrores da tragédia e sabe que ela ainda nos acompanhará por muitos anos. Mas, ele nos mostra a tragédia com uma visão diferenciada. Somos todos vítimas e cúmplices ao mesmo tempo.
Hoje, na época da publicação dessa matéria, a mancha de lama já havia atingido o litoral sul da Bahia. O turismo do litoral capixaba e baiano já sofrem com as consequências. Muitas histórias amargas ainda serão contadas:

"A tragédia de Mariana já é tida como o pior desastre ambiental do Brasil, com consequências que vão impactar a população e um ecossistema inteiro por anos a fio. Logo que as noticias começaram a se disseminar, a caça aos responsáveis se instalou e mergulhamos numa bolha de competição, raiva e culpas.
Mas, sem desmerecer a dor e sofrimento daqueles que a lama impactou, digo que não há culpados personificados, pessoas em quem podemos jogar toda a responsabilidade pelo ocorrido. Não há para quem apontar o dedo que não seja para nós mesmos. Somos todos vitimas e ajudantes da tragédia.
Antes do tsunami de lama varrer cidades inteiras, já havia lagos enormes, represas gigantescas, espalhadas pelo Brasil e o mundo, desenhadas para armazenar rejeitos, refugos, resíduos tóxicos, para os quais não vemos utilidade. E nós não dissemos nada, achamos normal.
Antes das barragens existirem, aceitamos a instalação de uma indústria que impacta a biosfera, que abre buracos enormes no chão, que move montanhas para tirar de lá os materiais que constroem nossa identidade. E nós não dissemos nada, achamos normal.
Seguimos sustentando essa indústria com o nosso padrão de vida, comprando e consumindo desenfreadamente, sem pensar no impacto que a nossa fome por novos “brinquedos” causa no mundo. E nós não dissemos nada, achamos normal.
Compramos e consumimos sendo levados pela nossa carência e ansiedade, pela nossa necessidade de novidades, pela nossa incapacidade de ver os impulsos surgindo e nos arrastando. E nós não fizemos nada, achamos normal.
Quando digo que nada fizemos, quero dizer que não desenvolvemos a curiosidade de entender como nossa mente opera e como isso interfere na nossa ação no mundo. Não desenvolvemos nossa atenção e consciência para sacar que nós não precisamos daquilo que as propagandas vendem como felicidade. Não duvidamos da nossa aposta de felicidade em coisas e condições externas. Não suspeitamos que, desenvolver nosso consumo consciente e economia da atenção possa ajudar a resolver vários dos problemas modernos.
Cada um de nós tem um pouco da lama de Mariana respingada no rosto.
Que possamos usar das imagens e informações do desastre para fazermos um autoexame e questionar nossa participação nisso tudo. Que possamos aproveitar que o impacto e terror ainda estão frescos nas nossas mentes para tentarmos simplificar mais e mais a vida, o cotidiano, o tempo e as necessidades materiais, como forma de ajudar o planeta e salvar vidas no futuro.
Que possamos cultivar a autocompaixão, a compaixão pelos que foram atingidos pela tragédia, a compaixão pelos que estão ajudando, mas também, que possamos cultivar a compaixão pelos empregados e dirigentes das empresas envolvidas, que estão acometidos pelos mesmos obstáculos que nós.

Este não é um chamado para volta à idade da pedra e nem é uma tentativa de relativizar as devidas responsabilidades, é apenas a lembrança de que podemos respirar e lembrar de Mariana antes da nossa próxima compra." (Naelson Almeida)